GLOW – Terceira Temporada (2019)

O que acontece em Vegas, fica em Vegas. E, de fato, a série ficou por lá

O método de produção da Netflix faz com que novos shows tenham cada vez menos chances de ganharem continuidade. Isso, pois, não basta ser algo que angarie fãs com o tempo, como a TV tradicional fez com hoje fenômenos, tais como Breaking Bad e Game of Thrones, é preciso uma plateia imediata. E é por isso que a empresa vem apostando tanto em adaptações e propriedades intelectuais já conhecidas, de modo a puxar uma audiência externa ao invés de conquistar uma sua. E é com essa estratégia que muitos shows se despedem antes mesmo de fecharem as cortinas. Ou desligarem as luzes do ringue.

Pôster de GLOW - Terceira Temporada
© 2019 Netflix Studios, LLC

Fora da TV, as garotas do GLOW agora exibem o seu espetáculo de wrestling em um hotel em Las Vegas, conquistando um sucesso inesperado. Se de um lado o dinheiro finalmente entra, do outro, a vida pessoal de todos os envolvidos é impactada por essa temporada longe de casa. O que inclui Debbie (Betty Gilpin) e a distância do seu filho, Ruth (Alison Brie) e sua persistência na carreira de atriz, além de Bash (Chris Lowell), cujo esgotamento com o show esconde, na verdade, o cansaço de viver um casamento de mentira.

A terceira temporada de GLOW parte para um cenário bem diferente em relação aos anos anteriores, com a aventura das garotas em Vegas deixando até mesmo o wrestling de lado. Com menos combates em tela, fazendo da luta apenas um artefato de fundo, a série arranja espaço para focar no dilema de suas diversas personagens, cada uma recebendo seus minutos de tela, vivendo um momento no qual o sucesso não parece ser mais o suficiente para suprir outros desejos, como: formar uma família, estabelecer uma carreira ou de fato embarcar no wrestling de verdade.

Essa discussão sobre fugir de uma vida automática acaba por prejudicar o show em si, fugindo, por pouco, dessa mesma maldição. Não é como se GLOW tivesse ficado ruim em seu — forçado — ano final, mas as coisas não parecem brilhar como antes, sendo essa uma clara história de transição para o seu real desfecho, planejado para uma inexistente quarta temporada. A pandemia de covid-19 ceifou tais planos, sendo impossível gravar uma produção com tanto contato físico e, quando a situação normalizasse, seria tempo demais para o show conquistar a atenção do público. Ao menos esse é o pensamento em métricas do mercado de streaming. E falar dos bastidores do entretenimento é algo que GLOW faz em seu último respiro.

Além do universo dos shows em Vegas, com a entrada da personagem de Geena Davis, Debbie passa por uma grande transformação na terceira temporada, saindo da frente das telas e atuando também por trás do palco. Betty Gilpin sempre foi um dos destaques da série, mas é no ano final que ela, com sua Liberty Belle, é alçada como protagonista do show. Isso em sua jornada de tentar ser uma mulher de negócios em um ambiente masculinizado, ainda mais nos anos 80, tirando o destaque de uma apagada Ruth, ofuscada pelo sucesso profissional da amiga, ficando rejeitada no show como um todo.

Mesmo com um certo desnível entre o espaço dado a cada uma das personagens, é gratificante ver como a série comandada pela dupla Liz Flahive e Carly Mensch se preocupou com a evolução delas como um grupo, com o show despedindo-se de suas lutadoras em uma posição diferente de como começaram, cada uma com novos caminhos a serem trilhados, apesar do fim abrupto do seriado. Algo que ajuda GLOW a se despedir ao menos de forma satisfatória, mesmo que de maneira não planejada.

Muito disso vem também do amadurecimento de temas plantados em temporadas anteriores, como Sheila (Gayle Rankin), que se despe de vez da pele de lobo que a aprisionava, ou a descoberta sexual de Arthie (Sunita Mani). Ela que caminha em direção oposta a Bash, que esconde sua real orientação de si, temendo as represálias da mãe e do mundo e um período tão excessivo, mas acima de tudo conservador, quando se fala do meio cultural norte-americano dos anos 80. Essa é inclusive a temporada que mais abraça o público LGBTQIA+, enquanto faz o mesmo com seus personagens, como em O Baile (3×9).

De modo geral, apesar de ser a temporada mais fraca, GLOW tem o fim de sua carreira decretado antes da hora, mas não deixa de registrar um legado positivo para todos que embarcaram nesse ringue, apesar da própria série, erradamente, também deixar de lado um cenário de entretenimento puro. Não totalmente, claro, pois ainda há o divertido Terça-Feira Muito Louca (3×5), seguimos com o mau-humor contagiante de Sam (Marc Maron), as trapalhadas de Melanie (Jackie Tohn) e as frases de vilã russa estereotipada de Zoya, a Destruidora. Ou seja, ainda deu para se divertir antes de apagarem as luzes. Até porque em Vegas o show está sempre a postos.

Criado por: Liz Flahive e Carly Mensch
Roteiros: Liz Flahive, Carly Mensch, Sascha Rothchild, Rachel Shukert, Isaac Oliver, Marquita J. Robinson e Victor Quinaz
Direção: Claire Scanlon, Mark A. Burley, Jesse Peretz, Anya Adams, Alison Brie, Lynn Shelton e Phil Abraham
Elenco: Alison Brie, Betty Gilpin, Sydelle Noel, Britney Young, Marc Maron, Britt Baron, Chris Lowell, Sunita Mani, Kate Nash, Gayle Rankin, Kia Stevens e Jackie Tohn
Trilha Sonora: Craig Wedren
Fotografia: Chris Teague e Jeffrey Waldron
Produtores Executivos: Liz Flahive, Carly Mensch, Jenji Kohan, Tara Herrmann e Mark A. Burley
Rede de exibição original: Netflix
Nº de episódios: 10

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