Divertida Mente (2015)

Caraminholas na cabeça

O que move o ser humano? A resposta costuma ir para respostas intuitivas como família, amor, alegria ou busca por alcançar tal plenitude. Dependendo do campo de estudo da pessoa, esse retorno pode ganhar outras formas, como o pensamento crítico, o convívio em sociedade ou até mesmo o funcionamento dos órgãos. Ninguém está errado, mas para os artistas a imaginação pode ser uma resposta de grande valor. E é com essa linha que a Pixar sempre entregou suas produções, até o dia que levou tal ideia de forma literal.

Pôster de Divertida Mente
© 2015 Disney/Pixar

Riley é uma garota de 11 anos, que sempre contou com o apoio da família e dos amigos. Tudo desmorona quando ela precisa se mudar para São Francisco, vendo sua vida mudar de ponta cabeça. Ou ao menos é assim que está sua mente, antes comandada por sentimentos como Alegria (Amy Poehler/ Miá Mello), mas que agora vê o controle, ou a falta dele, sendo dividido por emoções como Raiva (Lewis Black / Leo Jaime), Medo (Bill Hader / Otaviano Costa), Nojinho (Mindy Kaling / Dani Calabresa) e, principalmente, Tristeza (Phyllis Smith / Katiuscia Canoro).

Durante muito tempo existiu uma piada sobre como os filmes da Pixar partiam do princípio do “e se tal coisa tivesse emoções”, passando por brinquedos, insetos, peixes, até chegar em algo mais complexo. E se as emoções tivessem emoções? É com essa premissa que Pete Docter comandou um dos projetos mais ambiciosos do estúdio, servindo de base dali em diante para diversas teses de psicologia e até de inspiração para novos alunos de psicologia. Agora, o porquê de Divertida Mente ser um dos maiores sucessos originais da Pixar está muito associado à riqueza emocional do projeto. Até mesmo sua simplicidade.

Em entrevistas o diretor confirmou que a maior inspiração do filme veio de casa, enquanto via sua filha crescer. E é essa proximidade que torna Divertida Mente em algo tão especial, nos fazendo refletir sobre o tortuoso processo de crescimento das crianças, além de olhar para aquilo que passamos. Se existe uma complexidade no mundo, tamanha profundidade muitas vezes consegue ser ainda maior do lado de dentro, com a animação retratando isso de forma criativa e visualmente atrativa.

Sensações como o esquecimento e o déjà vu dão origem a sequências inventivas, em um filme que usa do humor para retratar fenômenos naturais da mente humana. É a fonte criativa dos animadores trabalhando para retratar a si mesma, personificando não só sentimentos e memórias, como é o caso de Bing Bong (Richard Kind), um amigo imaginário que cumpre sua função, para depois ser esquecido, como uma lembrança infantil.

Se a música é um elemento importante para impulsionar a mente de muitos — inclusive para eu escrever esse texto — para um filme sobre a psique humana ela é essencial. Parceiro comum da Pixar, Michael Giacchino compôs aqui uma de suas melhores trilhas para o estúdio, junto de obras como Os Incríveis (2004) e Up – Altas Aventuras (2009), com um tema melancólico, que reúne um sentimento de tristeza e alegria. Junto a isso, temos faixas que montam um divertido parque de diversões, passeando pela cabeça de uma criança. Uma fantasia que vai dando espaço a algo mais sombrio.

O clímax de Divertida Mente é uma sequência forte, em que visualmente Docter retrata o que seria o surgimento da depressão. Um estado que não está ligado ao domínio da tristeza, mas sim a um processo de anestesia, quando, na verdade, nenhum sentimento passa pela pessoa. É mais sobre um vazio dominante. Noção que fala sobre a importância em vivenciar cada uma das emoções, reconhecendo a relevância de cada. Algo que valoriza também cada um desses personagens para a história. Isso além de alertar para a noção de uma positividade tóxica que ganha vida com sua protagonista Alegria, bandeira fácil de se encontrar nas redes sociais.

É curioso como quase 10 anos depois, quando o próprio Docter passou a atuar como chefe do estúdio, o líder atual da Pixar parece não compreender o que fez do seu filme um sucesso. Isso por causa de um comunicado recente dizendo que daqui para frente o estúdio irá focar em histórias menos pessoais dos seus diretores, buscando um apelo maior. Bem, esse tom pessoal sempre esteve associado a essas animações, basta pesquisar os bastidores de cada uma.

Mesmo com um trabalho excelente de construção de maquetes imaginárias sobre como seria a estrutura da mente humana, o grande apelo de Divertida Mente vem de algo mais íntimo, o crescimento de uma filha. Um filme sobre tentar entender o que se passa dentro de outra pessoa quando, no fim, a gente nem sequer compreende o que ocorre dentro de nós mesmos.

Direção: Pete Docter
Roteiro: Pete Docter, Meg LeFauve e Josh Cooley
Elenco: Amy Poehler, Phyllis Smith, Richard Kind, Bill Hader, Lewis Black, Mindy Kaling, Kaitlyn Dias, Diane Lane e Kyle MacLachlan
Trilha Sonora: Michael Giacchino
Fotografia: Patrick Lin (câmera) e Kim White (iluminação)
Montagem: Kevin Nolting
Produzido por: Jonas Rivera
Título Original: Inside Out

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